terça-feira, 26 de junho de 2012

Fechamento do Curso - Dia 3/7, às 14h

Caros,
o fechamento do nosso curso, com o poeta e pesquisador Paulo Ferraz, ficou marcado para a próxima terça, dia 03.07.

Mais poemas de Ana C., enviados pela Annita Costa Malufe

[poemas de A teus pés]

Trilha sonora ao fundo: piano no bordel, vozes barganhando uma informação difícil. Agora silêncio; silêncio eletrônico, produzido no sintetizador que antes construiu a ameaça das asas batendo freneticamente.
Apuro técnico.
Os canais só existem no mapa.
O aspecto moral da experiência.
Primeiro ato da imaginação.
Suborno no bordel.
Eu tenho uma idéia.
Eu não tenho a menor idéia.
Uma frase em cada linha. Um golpe de exercício.
Memórias de Copacabana. Santa Clara às três da tarde.
Autobiografia. Não, biografia.
Mulher.
Papai Noel e os marcianos.
Billy the Kid versus Drácula.
Drácula versus Billy the Kid.
Muito sentimental.
Agora pouco sentimental.
Pensa no seu amor de hoje que sempre dura menos que o seu amor de ontem.
Gertrude: estas são idéias bem comuns.
Apresenta a jazz-band.
Não, toca blues com ela.
Esta é a minha vida.
Atravessa a ponte.
É sempre um pouco tarde.
Não presta atenção em mim.
Olha aqueles três barcos colados imóveis no meio do grande rio.
Estamos em cima da hora.
Daydream.
Quem caça mais o olho um do outro?
Sou eu que admito vitória.
Ela que mora conosco então nem se fala.
Caça, caça.
E faz passos pesados subindo a escada correndo.
Outra cena da minha vida.
Um amigo velho vive em táxis.
Dentro de um táxi é que ele me diz que quer chorar mas não chora.
Não esqueço mais.
E a última, eu já te contei?
É assim.
Estamos parados.
Você lê sem parar, eu ouço uma canção.
Agora estamos em movimento.
Atravessando a grande ponte olhando o grande rio e os três barcos colados imóveis no meio.
Você anda um pouco na frente.
Penso que sou mais nova do que sou.
Bem nova.
Estamos deitados.
Você acorda correndo.
Sonhei outra vez com a mesma coisa.
Estamos pensando.
Na mesma ordem de coisas.
Não, não na mesma ordem de coisas.
É domingo de manhã (não é dia útil às três da tarde).
Quando a memória está útil.
Usa.
Agora é a sua vez.
Do you believe in love...?
Então está.
Não insisto mais.


Atrás dos olhos das meninas sérias
Aviso que vou virando um avião. Cigana do horário nobre do adultério. Separatista protestante. Melindrosa basca com fissura da verdade. Me entenda faz favor: minha franqueza era meu fraco, o meu primeiro side-car anfíbio nos classificados de aluguel. No flanco do motor vinha um anjo encouraçado, Charlie’s Angel rumando a toda para o Lagos, Seven Year Itch, mato sem cachorro. Pulo para fora (mas meu salto engancha no pedaço de pedal?), não me afogo mais, não abano o rabo nem rebolo sem gás de decolagem. Não olho para trás. Aviso e profetizo com minha bola de cristais que vê novela de verdade e meu manto azul dourado mais pesado do que o ar. Não olho para trás e sai da frente que essa é uma rasante: garras afiadas, e pernalta. 


Travelling
Tarde da noite recoloco a casa toda em seu lugar.
Guardo os papéis todos que sobraram.
Confirmo para mim a solidez dos cadeados.
Nunca mais te disse uma palavra.
Do alto da serra de Petrópolis,
com um chapéu de ponta e um regador,
Elisabeth reconfirmava, “Perder
é mais fácil que se pensa”.
Rasgo os papéis todos que sobraram.
“Os seus olhos pecam, mas seu corpo
não”, dizia o tradutor preciso, simultâneo,
E suas mãos é que tremiam. “É perigoso”,
ria a Carolina perita no papel Kodak.
A câmera em rasante viajava.
A voz em off nas montanhas, inextinguível
fogo domado da paixão, a voz
do espelho dos meus olhos,
negando-se a todas as viagens,
e a voz rascante da velocidade,
de todas três bebi um pouco
sem notar
como quem procura um fio.
Nunca mais te disse
uma palavra, repito, preciso alto,
tarde da noite,
enquanto desalinho
sem luxo
sede
agulhadas
os pareceres que ouvi num dia interminável:
sem parecer mais com a luz ofuscante desse mesmo dia interminável.


Sábado de aleluia
Escuta, Judas.
Antes que você parta pro teu baile.
A morte nos absorve inteiramente.
Tudo é aconchego árido.
Cheiro eterno de Proderm.
Mesa posta, e as garras da vontade.
A gana de procurar um por um
e pronunciar o escândalo.
Falar sem ser ouvida.
Desfraldar pendengas: te desejo.
Indiferença fanática ao ainda não. 

terça-feira, 5 de junho de 2012

AVISO - 05/06

Caros, esta semana não haverá aula no nosso curso. Semana que vem, dia 12/06, retomaremos nossas atividades com a aula de Annita Costa Malufe sobre Ana Cristina Cesar. Bom feriado!

domingo, 27 de maio de 2012

29.06 - Armando Freitas Filho

a) Bibliografia on-line:
BUARQUE, Heloisa Buarque de. "longa vida, o poema". Acesso: <http://www.heloisabuarquedehollanda.com.br/?p=591>


MORICONI, Italo. "3x4: poesia à beira do abismo". In: Matraga, ano I, Rio de Janeiro: nov. de 1996. Acesso: <http://www.pgletras.uerj.br/matraga/matraga00/matraga0a07.pdf>


PENNA, João Camillo. "Acontece?". In: Alea: Estudos neolatinos. Rio de Janeiro: UFRJ, jan-jul de 2003. Acesso: <http://www.scielo.br/pdf/alea/v5n1/20350.pdf>


b) Entrevista (Vereda Literária, 2000):
http://www.youtube.com/watch?v=rCEOd1ThIHE


c) Poemas:




ESCRITURA


No escuro eu não apuro
o que de você existe entrelaçado
neste muro: no escuro o que procuro
é a cruz do seu corpo, a cicatriza
o punho, a palma no instante
da abertura, o espaço tão vazio
onde situo, a perda, a ruptura
a veia degolada, e gota a gota
o inútil rumo do meu sangue:
um derrame de ramos feito de sussurros 

e esta ferida que não pára
e que tanto me custa descrevê-la
e quanto mais eu grito, mais ela fura: 

sanha, descostura de mim – amor
eu sangro aqui, sob a lâmina
de sua fala, assim, punhal
palavra que não seguro e se enterra
até o fundo, até o cabo, em toda a treva 

e na esplanada de areia da memória
o que escrevo é somente um risco
um corte que a lembrança acorda
ou este acorde que suas garras tocam. 



(in De corpo presente, 1975)


*




Quem escreviver verá 
a vida voando
lá fora...............em versos livres
e brancos
enquanto aqui dentro
os exércitos da imaginação 
combatendo na sombra 
marcham para a derrota
e são comidos
até o fim pelos cupins 
pelas traças
e tudo será
uma página virada
do dilúvio
...............e depois
há muitos carnavais
quem escreve sempre alcança 
a quem?
...............O quê?

(in longa vida, 1982)



*




Abrir os pulsos 
......... as gavetas
e cortar as veias
enquanto é tempo
de salvar a vida
e impedir que o poema 
caia
................em si mesmo
como os repuxos, os reflexos

os anúncios
luminosos
que trabalham sempre
com a mesma água
sem o risco das hemorragias.

(in 3x4, 1985) 

*

LUVA DE BOXE

Muito cabelo. Negro
secreto.
..................... Pés de megera

de tanto ódio.


Chupar tudo – todo veneno 
sem ter medo de ser tão sujo. 
Ir no escuro
...............rasgando o vermelho 
chumbo certeiro até o fundo.


E mordendo forte
os próprios dentes
as unhas pretas
o último osso.



Enxugando a pele
até a ferida
para que o sangue suba 

e então transborde 
com tamanha culpa.


Amor. Todos os golpes
de mão fechada no mesmo ponto 

para acabar matando
os que têm seu nome.


(in De cor, 1988)



*



OLHE PARA TRÁS, COM RAIVA


Cara, ainda em vida, comendo
a carne de rato do próprio rosto.
Cabeça de um, hirsuta, rabo melado
do outro, alternando-se nas pontas
de um corpo imprestável que se rói
por fora. Calda, gritantemente doce! 

Néctar não há que alcance, alimente
e cale o arrepio da fome açucarada
que já apodrece o focinho que se volta 

morde, bebe e vive de sua cauda pegajosa.


(in Duplo Cego, 1997) 


*


CAÇAR EM VÃO



Às vezes escreve-se a cavalo. 
Arremetendo, com toda a carga. 
Saltando obstáculos ou não. 
Atropelando tudo, passando
por cima sem puxar o freio –
a galope – no susto, disparado 

sobre as pedras, fora da margem 
feito só de patas, sem cabeça 
nem tempo de ler no pensamento 
o que corre ou o que empaca: 
sem ter a calma e o cálculo
de quem colhe e cata feijão.



(in Fio terra, 2000) 


*




EMULAÇÃO
 
Sua morte empurrou minha mão.
Sua mão pesa sobre a minha
e a faz escrever com ela
não como luva de outra pele
mas como enxerto de outra carne
emperrada, como a vida dela
que parou, e vai apodrecendo
dentro da minha, suando suor igual. 

(in Raro mar, 2006)


d) Poema inédito do poeta no blog do Instituto Moreira Salles: 
http://blogdoims.uol.com.br/ims/c-d-atlantico-por-armando-freitas-filho/



terça-feira, 15 de maio de 2012

Aula de 22.05 - Afonso Henriques Neto (texto de apoio)

Para baixar os slides apresentados em aula, clique aqui.

Inventário de ruínas – a questão da herança literária na poesia de Afonso Henriques Neto

Andréa Catrópa da Silva



A alegoria de Afonso Henriques é fortemente evocativa, uma espécie de inventário de ruínas – familiares, ideológicas, pessoais. (...) O mundo está degradado, mas ainda vale a pena: o poeta retira da visão desencantada o móvel para repropor o sonho. (...) A poesia, sendo sonho, é ainda a ponte que possibilita o trânsito entre o poeta e o mundo.
Cacaso



Na observação de Cacaso acerca de um poeta seu contemporâneo, também relacionado na década de 70 à euforia e ao estardalhaço promovidos pela “poesia marginal” carioca, há uma aguda percepção dos paradoxos e das descontinuidades que alimentam a obra de Afonso Henriques Neto, desde o primeiro livro, O Misterioso Ladrão de Tenerife (1972), até sua mais recente publicação, Cidade Vertigem (2005).
A heterogeneidade de sua poesia é uma constante, por mais irônica que possa parecer esta afirmação, e dificulta tanto a empatia imediata com o leitor como a tarefa do crítico. Em muitos de seus poemas, predominam os versos “caudalosos”, que apresentam uma torrente de imagens oníricas ou desconexas e figuram uma realidade caótica, mais próxima, talvez, do pesadelo do que do sonho. No entanto, nesses poemas, há um vislumbre de esperança, que se intromete no texto pelas pequenas frestas nele abertas por imagens intensamente líricas, que valorizam a especificidade do poético, como em “Texto” (AUGUSTO; HENRIQUES NETO, 1972, P.21):


“Oh espina clavada em el hueso
  Hasta que se oxidem los planetas
(Federico Garcia Lorca)

O texto, escura escama, pesadelo de eternidade,
máscara densa do universo vomitando.
O texto, mas não a energia que o pensou,
interrogando a simultaneidade absoluta.
Há uma esperança nas ruas, nas pedras, no acaso
de tudo, uma esperança, uma forma suspensa
entre o aparente e a essência, entre o que vemos
e a substância, uma esperança, uma certeza talvez
de que o rio não se dissolva no mar, de que
o ínfimo, o precário, a voz, a sombra,
o estalar das carnes na explosão
não se dispersem no todo, impensável medusa da inexistência.
Há uma luz qualquer sonhando integração, o suposto
destino dos ventos, das energias globais, a suposta
sabedoria com que o homem fecundou a crosta
envenenada do planeta, há uma luz qualquer
ensaiando águas pensadas no eterno esvair-se,
abstrato expansionário, há uns olhos além
da frágil realidade, da terrível matança, da
cruel carnificina entre seres pestilentos aquém
da fronteira do sonho, um texto além do texto,
uma esperança talvez, enquanto somos e nos cumprimos,
enquanto somos e nos oxidamos, enquanto
somos e prosseguimos.


(Este texto foi apresentado no Congresso Abralic, em 2006. Para continuar lendo, é só clicar aqui e baixá-lo.)
http://www.4shared.com/office/3IJvo-qo/ahnandreacatropa.html

domingo, 22 de abril de 2012

Aula 3 - José Paulo Paes

Aula 3 - José Paulo Paes

Poemas vistos na aula:

EPITÁFIO PARA UM BANQUEIRO
n e g ó c i o
  e g o
       ó c i o
          c i o
               0

EXERCÍCIO ORTOGRÁFICO
metafísica
metaphysica
metaphtysica

OCIDENTAL
a missa
a miss
o míssil

À MODA DA CASA
feijoada
marmelada
goleada
quartelada

CRONOLOGIA
A.C.
D.C.
W.C.

------------------------------------------------
CANÇÃO DO EXÍLIO FACILITADA lá?
ah!

sabiá...
papá...
maná
sofá...
sinhá...

cá?
bah!

OLÍMPICA

ufa ufa ufa ufa
por ufa ufa ufa
ufa que ufa  ufa
ufa  ufa me ufa
ufa  ufa  ufa ufa
no  ufa  ufa  ufa
ufa  do  ufa  ufa 
ufa   ufa  meu  pa
ufa   ufa  ufa  pa
ís   ufa   uff    fff

SEU METALÉXICO
Economiopia
Desenvolvimentir
Utopiada
Consumidoidos
Patriotários
Suicidadãos

___________________________
O LIBERTADOR
   frei          id
         freiid
         freud

UM SONHO AMERICANO
CIA ilimitada
LAR
espaço que separa
o volkswagen
da televisão

NEOPAULÍSTICA
pelo mesmo Tietê
onde outrora viajavam
bandeirantes heris

só viajam agora
os dejetos: bandeira
de seus filhos fabris

---------------------------------------
O POETA AO ESPELHO, BARBEANDO-SE

o rito
do dia
o ríctus
do dia
o risco
do dia
EU?
UE?
olho
por olho
dente
por dente
ruga
por ruga
EU?
UE?
o fio
da barba
o fio
da navalha
a vida
por um fio
EU?
UE?
mas a barba
feita
a máscara
refeita
mais um dia
aceita
EU
EU
ENTROPIA
não que a chama não
queime a luz perdesse      
razão de iluminar

não que a boca não
morda ao fruto falte
o bíblico sabor

mas e a crescente
sensação de morno?
o ver sem ver? Um fel

vagomelancólico
a perturbar agora
a digestão de adão?

SALDO

     a torneira seca
     (mas pior: a falta
     de sede)

     a luz apagada
     (mas pior: o gosto
     do escuro)

     a porta fechada
     (mas pior: a chave
     por dentro)
______________________________

ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA
a poesia está morta

mas juro que não fui eu

eu até que tentei fazer o melhor que podia para salvá-la

imitei diligentemente augusto dos anjos paulo torres carlos drummond de andrade manuel bandeira murilo
mendes vladmir maiakóvski joão cabral de melo netopaul éluard oswald de andrade guillaume appolinaire sosígenes costa bertolt brecht augusto de campos

não adiantou nada

em desespero de causa cheguei a imitar um certo (ou incerto) josé paulo paes poeta de ribeirãozinho estrada de ferro araraquarense

porém ribeirãozinho mudou de nome a estrada de ferro araraquarense foi extinta e josé paulo paes parece
nunca ter existido

nem eu


À MINHA PERNA ESQUERDA
1
Pernas
para que vos quero?

Se já não tenho
por que dançar.

Se já não pretendo
ir a parte alguma.

Pernas?
Basta uma.

2
Desço
           que                                subo
                     desço        que
                             subo
                            camas
                           imensas.

Aonde me levas
todas as noites
                              pé morto
                              pé morto?
Corro, entre fezes
de infância, lençóis
hospitalares, as ruas
de uma cidade que não dorme
e onde vozes barrocas
enchem o ar
de p
     a
     i
     n
     a sufocante
e o amigo sem corpo
zomba dos amantes
a rolar na relva.
 
Por que me deixaste
                    pé morto
                    pé morto
a sangrar no meio
de tão grande sertão?
                   não
                   n ã o
                   N Ã O !   

4
Dizem que ontem à noite um inexplicável morcego assustou os pacientes da enfermaria geral.

Dizem que hoje de manhã todos os vidros do ambulatório apareceram inexplicavelmente sem tampa, os rolos de gaze todos sujos de vermelho.

5
Chegou a hora
de nos despedirmos
um do outro, minha cara
data vermibus
perna esquerda.
A las doce en punto
de la tarde
vão nos separar
ad eternitatem.
Pudicamente envolta
num trapo de pano
vão te levar
da sala de cirurgia
para algum outro (cemitério
ou lata de lixo
que importa?) lugar
onde ficarás à espera
a seu tempo e hora
do restante  de nós.

6
esquerda            direita
esquerda            direita
                           direita
                           direita
Nenhuma perna
é eterna.       
7
Longe
do corpo
terás
doravante
de caminhar sozinha
até o dia do Juízo.
Não há
pressa
nem o que temer:
haveremos
de oportunamente
te alcançar.

Na pior das hipótese
se chegares
antes de nós
diante do Juiz
coragem:
não tens culpa
(lembra-te)
de nada.

Os maus passos
quem os deu na vida
foi a arrogância
da cabeça
a afoiteza
das glândulas
a incurável cegueira
do coração.
Os tropeços
deu-os a alma
ignorante dos buracos
da estrada
das armadilhas
do mundo.
Mas não te preocupes
que no instante final
estaremos juntos